LER CRITICAMENTE O MUNDO HOJE NO BRASIL DIALOGANDO COM OS CLÁSSICOS DA FILOSOFIA MODERNA

Apresentação:

Este projeto procura dar resposta às dificuldades na leitura de textos filosóficos, manifestadas pela maioria dos discentes matriculados nas disciplinas História da Filosofia Moderna. Conforme as discussões desenvolvidas na disciplina do Laboratório do ensino da Filosofia do Mestrado Profissional em Filosofia (2022-2) a experiência em sala de aula dos discentes professores na Educação básica, sugere que estas dificuldades lidam não apenas com carências na formação dos discentes na educação básica, senão também com as maneiras em que se ensina a filosofia por um lado, e com as soluções habitualmente oferecidas para resolver este problema pelo outro. Ademais, no estudo e na pesquisa na área da Filosofia no Brasil, o “eurocentrismo” e o “elitismo” são questões sempre mais presentes nas preocupações dos discentes, em particular das Universidades que, historicamente, não fazem parte dos círculos da excelência nacional. Sendo a Filosofia Moderna profundamente vinculada com a época das colonizações políticas e culturais europeias, a maioria dos alunos vivencia seu estudo como algo “imposto”, “exótico” ou “alheio” desenvolvendo atitudes repulsivas ou sentimentos de hostilidade a priori que prejudicam o processo de aprendizagem.
Para lidar com estas vivencias o dispositivo pedagógico proposto inspirou-se numa observação de Paulo Freire na Pedagogia do Oprimido, na qual o pedagogo brasileiro critica a atitude “bancária” destacando como muitas vezes a linguagem do educador “não sintoniza com a situação concreta dos homens a quem falam”. Sendo assim “sua fala é um discurso a mais, alienado e alienante” (Rio de Janeiro: Paz e terra, 2012, p. 102). Destarte, é preciso a elaborar estratégias para que os conteúdos “falem” aos discentes na situação concreta. Conforme este diagnostico esboçado a presente proposta desenvolve, justamente, uma estratégia pedagógica que visa articular Ensino, Extensão e Pesquisa fomentando uma apropriação crítica dos autores e questões da Filosofia Moderna a partir da “situação concreta” dos alunos e das expressões culturais que percebem como mais próximas (expressão de arte popular e marginal, clássicos da literatura e do cinema). Trata-se assim da metodologia elaborada por Silvio Galllo na área do Ensino da Filosofia.
A estratégia proposta procura declinar o método de alfabetização de Paul Freire ao estudo dos “clássicos” da filosofia. A noção de “clássico” é introduzida pelas teses de Ítalo Calvino a respeito (Por que ler os clássicos? São Paulo: Companhia das letras, 1993). A proposta pedagógica consiste em apresentar os clássicos da Filosofia Moderna como uma espécie de alfabeto do pensamento crítico por um lado, e entender a leitura dessas obras como a ocasião de instituir um diálogo com esses autores para entendermos criticamente o nosso presente e refletirmos sobre nossa maneira (isso é as categorias conceitos que utilizamos) de apreendê-lo pelo outro. Enquanto clássicos as autoras, os autores e obras estudadas tornam-se como interlocutores com os quais ler o mundo e refletir criticamente sobre nossas modalidades de apreendê-lo. O diálogo com esses autores torna-se uma maneira de apropriar-se criativamente deles para desconstruir e descodificar as imagens do mundo que recebemos incônscia ou passivamente, e assim testar a pertinência das categorias herdadas da modernidade na compreensão da realidade concreta na qual estamos inseridos.

Objetivos:

O objetivo geral é fomentar uma responsabilização dos discentes no processo de ensino-aprendizagem juntamente com uma “inserção crítica” deles (e da Filosofia) na Universidade e na Sociedade.

Os objetivos específicos são:
• Desenvolver uma leitura crítica dos clássicos do pensamento moderno;
• Fomentar a apropriação crítica das questões e dos clássicos da Filosofia Moderna na situação concreta dos alunos;
• Problematizar nossa leitura do mundo através dos clássicos da Filosofia Moderna;
• Fomentar o protagonismo dos discentes através do diálogo e da (auto)crítica;
• Questionar a importância do estudo da Filosofia Moderna hoje no Brasil estimulando uma apropriação criadora de suas autoras e autores;
• Fomentar o diálogo intercultural e interdisciplinar através do desenvolvimento de um questionamento filosófico dos temas de atualidade ou expressões artísticas ou culturais mais próximas dos discentes (música, literatura, teatro, cinema).

Pressupostos:

Este projeto desenvolve uma dinâmica baseada na experiência ilustrada anteriormente e na reflexão realizada no seio do Laboratório de Estudos e Pesquisas Materialistas. De fato, este projeto lida com uma temática presente desde sempre no estudo e pratica da Filosofia. Em 1975 José Arthur Giannotti levantava a questão sobre o que animaria o educando a filosofar. O pesquisador brasileiro destacava o distanciamento ou “estranhamento atávico” do mundo como a situação imperativa para encontrar “um caminho produtivo” (Filosofia miúda e demais aventuras. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 13). Como ressalta Silvio Gallo a esse respeito:
A máxima kantiana impõe-se como dedução: não é possível ensinar filosofia, só podemos ensinar a filosofar. Mas o ato de filosofar só é possível pela mediação dos clássicos. O professor de filosofia é aquele que estabelece a interlocução entre os clássicos (o saber sistematizado) e a recusa secreta do mundo. Caminhando com o professor entre as veredas históricas da filosofia, o aluno elabora sua trajetória desse estranhamento atávico” (Ética e cidadania: caminhos da Filosofia. Campinas: Papirus Editora, 1995, p. 6).
Porém, de acordo com Calvino, a noção de clássico não se reduz apenas á “um saber sistematizado” ou canonizado. Pelo contrário clássico seria só aquele autor ou autora que se torna um interlocutor presente e pertinente para discutir a nossa atualidade.
A metodologia elaborada por Gallo (Filosofia uma experiência de pensamento. 2013) é explicitamente inspirada pela “pedagogia do conceito” de Deleuze e Guattari, e formaliza estratégias desenvolvidas espontaneamente em sala de aula, ministrando as disciplinas História da Filosofia e Introdução á Filosofia, com o objetivo de sensibilizar os discentes para a leitura dos clássicos da Filosofia Moderna em diálogo com demais referências da cultura brasileira (literatura e música popular) ou cinematográficas (estratos de Kubrick e Weir). Tendo inspirado os monitores em seus estágios curriculares o GT Laboratório de ensino: Trilhas filosóficas entre Goiabeiras e Itararé, tem o objetivo de elaborar com os alunos materiais que eles possam utilizar nos estágios tanto nas escolas da Rede Pública do Espírito Santo ou nas ações dos círculos de cultura nos Centros de Referências das Juventudes no Território do bem. A referência à cultura popular é feita para introduzir a pertinência de um diálogo com os clássicos e favorecer uma apropriação crítica e criadora deles. Como destaca Gallo trata-se de ““buscar uma linguagem que não seja nem aquela que os adolescentes usam em seu cotidiano nem uma outra, inacessível para eles” (Ética e cidadania. Caminhos da Filosofia. Campinas: Papirus Editora, 1995, p. 7).
Com os GT de capacitação para leitura e para a escrita o intuito é acompanhar os discentes cursistas no esforço para eles discutirem e eles se confrontarem com os clássicos do pensamento moderno. Neste âmbito desenvolve-se uma metodologia histórico-conceitual que tem seu enfoque nas ressignificações semânticas que caracterizam a História da Filosofia ocidental em geral, e a transição epocal estudada por Reinhart Koselleck como “época limiar” (Sattelzeit) – ela se caracterizando pelo surgimento dos “conceitos históricos fundamentais” – em particular.

Metodologia:

Conforme o EDITAL Nº 50/2022 PROGRAD/UFES os bolsistas desenvolvem ” as atividades previstas no Plano de Trabalho, proposto em regime de 20 (vinte) horas de dedicação semanal, sob a supervisão do(a) coordenador(a). Dentro dessa carga horária, dedicar 8 (oito) horas semanais à pesquisa, ao estudo de conteúdos, reuniões e formação com o intuito de ampliar a qualidade das atividades desenvolvidas e 12 (doze) horas aos projetos/estudantes”.
1) Reuniões hebdomadárias de coordenação (coordenador, bolsistas coordenadores dos GT): trata-se de reuniões de avaliação e planejamento da equipe.
2) Grupo de Trabalho para a capacitação para a leitura dos clássicos do pensamento moderno tratados em sala de aula. Organizado por dois bolsistas este grupo organiza a leitura e discussão para os participantes desenvolverem uma leitura ativa e crítica dos textos introduzidos e analisados nas disciplinas. Reuniões hebdomadárias de 1h30 presencial (antes da aula), e 1h30 de acompanhamento em remoto.
3) Grupo de Trabalho de capacitação para a elaboração de textos dissertativos. Coordenado por um bolsista com a participação de mais um este grupo visa o aprofundamento das temáticas abordadas em sala de aula com leituras e discussões complementares a partir das referências bibliográficas secundarias. Acompanhamento e trabalhos dirigidos em modalidade hibrida com apresentações e discussões cada duas semanas.
4) Laboratório de ensino da Filosofia Moderna do LPM: Trilhas Filosóficas entre Goiabeiras e Itararé: coordenado por um bolsista com a participação de mais um. Com base nas atividades dos dois outros GT, este GT se endereça particularmente aos discentes de Licenciatura para a elaboração de material didático-pedagogico a ser utilizado nos estágios e nos círculos de cultura e ateliês de Filosofia Moderna do LPM com base nos tópicos tratados nas disciplinas e a ser publicado no blog científico do LPM: lipm.hypotheses.org. Reuniões hebdomadárias de 1h30 presencial e 1h30 de acompanhamento em remoto.

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